O presidente do Fórum, Rodrigo Pinheiro, acredita que o novo modelo, em vigor desde 31 de janeiro, representa um retrocesso na luta contra a Aids
Adilson Soares, doutor em Saúde Coletiva e diretor de Departamento do Grupo de Apoio as Políticas de Prevenção e Proteção à Saúde da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo.
A flexibilização no modelo de financiamento do SUS continua preocupando ativistas da luta contra a aids de São Paulo. Desde que o ministro da Saúde, Ricardo Barros, anunciou as alterações no repasse de verbas para estados e municípios, no início de 2017, o tema vem sendo pautado nas reuniões ordinárias do Foaesp (Fórum de ONGs/Aids do Estado de São Paulo). Este foi justamente o tema central do primeiro encontro do grupo, em 2018. Eles querem saber, por exemplo, se existe alguma garantia de que a verba destinada à aids será investida em ações para minimizar os danos causados pela epidemia e frear o avanço da doença no País. Antes, a transferência ocorria através de seis blocos de financiamento: atenção básica, que envolve programas como o Saúde da Família; assistência farmacêutica, para medicamentos; assistência de média e alta complexidade, que abrange ações como exames, cirurgias e transplantes, por exemplo; vigilância em saúde; investimento, eixo que prevê novas obras e gestão.
Hoje, os repasses são feitos por meio de dois blocos, sendo um de custeio e outro de investimento. Ou seja, os valores que antes eram pré-determinados para ações prioritárias do governo, na área da saúde, passam a ser aplicáveis também em outras áreas similares, a depender da escolha dos gestores.
Com o novo formato, os gestores, segundo o Ministério da Saúde, terão “mais liberdade” para aplicar os recursos, levando em consideração as necessidades locais. “A proposta da mudança de financiamento vem da reforma sanitária brasileira. Eles sempre defenderam apenas um bloco de financiamento, uma única conta. Hoje, a discussão é sobre o momento que isso foi incorporado na saúde pública. Ainda não sabemos se é adequado, principalmente se levarmos em consideração que há uma crise econômica, escassez de recursos e que os gastos com saúde foram congelados por 20 anos, é importante garantir neste momento que as políticas públicas sejam mantidas, por isso, o gestor e o controle social serão fundamentais na continuidade das ações”. Ainda segundo o especialista Adilson, em São Paulo, tudo o que já foi pactuado será mantido. “Os recursos que caem nas contas estão garantidos, caberá ao gestor local a tarefa de identificar do montante de recursos o que vai para cada política. O estado vai sinalizar que existe verba para determinada área, mas o gestor tem autonomia para decidir se investe ou não ou em que momento investir em determinadas ações”.
Com a nova portaria, o Ministério da Saúde transfere para estados e municípios a responsabilidade de decidir em quais programas e serviços de saúde serão aplicados os mais de R$ 75 bilhões repassados, ao ano, pelo governo federal.
Segundo Rodrigo Pinheiro, alguns programas municipais de aids poderão ser extintos e, sem verba carimbada, a situação vai piorar cada vez mais. “Corremos o risco de ter no Brasil uma epidemia generalizada. A saída, por enquanto, será acompanhar nos municípios como os recursos vêm sendo aplicados. Mas vale lembrar que o orçamento de 2018 foi pactuado no ano passado e as novas regras só passarão a valer em 2019″.
O ativista propôs ainda que seja criado no estado de São Paulo uma portaria que garanta o recurso especifico para a aids. “Não podemos aceitar retrocessos na saúde. Já estamos nos mobilizando, junto as Frentes Parlamentar Mista de Enfrentamento às DST/HIV/Aids, para reverter a situação aqui e a nível nacional.”
Também presente na reunião, a coordenadora-adjunta do Programa Estadual de DST/Aids de São Paulo, Maria Clara Gianna, avaliou que “o debate nos trouxe novos entendimentos sobre a portaria. Temos clareza que é importante continuar investindo em conversas com as Secretarias Municipais de Saúde, temos que pactuar.”
Questionada sobre os prejuízos que a falta de verba pode trazer para a aids, Maria Clara disse: “Já conseguimos identificar que alguns municípios estão com um entendimento equivocado da utilização de recursos, ainda não dá para quantificar, mas sabemos que há coordenações menos estruturadas. O que precisa ficar claro é que o recurso da aids é muito importante para o desenvolvimento das ações em todo estado e a Secretaria Estadual tem o entendimento da importância da manutenção dos recursos.”
Medicamentos
Outro assunto debatido foi sobre o estoque de antirretrovirais no estado. De acordo com a infectologista MylvaFonsi, do Programa Estadual de DST/Aids de São Paulo, não há medicamentos em falta, mas quatro drogas estão com estoque baixo, para um mês: o 3 em 1, o biovir, o abacavir solução oral e o ritonavir solução oral.
“O Departamento de IST/Aids emitiu, nesta semana, uma nota sobre o 3 em 1. Caso o estoque fique zerado, fomos orientados a fornecer o 2 em 1 + efavirenz. ”
Sobre o biovir, foi dito que o estoque será normalizado na próxima semana.